Rapariga. Tu própria, que podes ter a noção e ao mesmo tempo o atrevimento de simplesmente expor de vez em quando uma opinião ou um seio: quando começa isso,
e no fundo quando acaba? As mulheres são feitas de raparigas, aos quarenta ainda deitam a língua de fora como aos quinze, ficam cada vez mais jovens,
não sabem não seduzir. Como a poesia: um gato que prudentemente caminha sobre as teclas de um piano e olha para trás: ouviste? viste-me?
Ah, o ar jovem das raparigas de quarenta, como umas vezes querem, e outras não, mas afinal sempre, se repararmos bem. Onde estão os bons velhos tempos? Estão aqui, esses tempos.
Poema- Herman de Coninck
HERMAN DE CONINCK, poeta belga (Mechelen, 1944) foi traduzido em Outubro de 1994 nos seminários de tradução colectiva de Mateus. A Quetzal editou-o em 1996, num livrinho revisto, completado e apresentado pelo poeta Nuno Júdice, intitulado Os Hectares da Memória.
Coninck, um dos mais importantes flamengos do pós-guerra, foi mais um desses poetas europeus como Egito Gonçalves, que tanto incomodaram os puristas por possuir uma notável capacidade de apreender de um quotidiano aparentemente estéril e banal, instantes sagazmente luminosos, através do uso de uma linguagem com notável capacidade discursiva, onde o humor não é o menor dos seus recursos. Foi um poeta do seu tempo: a fruição do leitor na leitura dos seus poemas resulta, suponho, da identificação com imagens suas contemporâneas que, com aparente objectividade, se dão a ler no poema.
Herman de Coninck morreu subitamente numa rua de Lisboa, em 1997, a caminho de uma reunião de poetas.
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